Assustado com o ressoar ininterrupto do telefone, Fábio pulou da cama como um gato. Pensou na hora que alguém havia morrido. Afinal, quem em sã consciência liga para a casa dos outros às 3h?
Após alguns segundos pensando no pior, resolveu atender.
- Oi... – disse-lhe a voz no outro lado. Tratava-se de uma voz sexy. Uma voz sem precedentes em seu histórico de conquistas.
- Oi – respondeu Fábio, enfim. – Quem é você?
- Se eu me identificasse, não teria a menor graça... Você não acha?
Fábio não achava mais nada àquela altura da noite. No entanto, sabia que a dona daquela voz não poderia ser uma mulher feia. Somente as belas eram agraciadas com aquele timbre, pensou.
- O que você quer? – perguntou-lhe Fábio.
- Você, é claro!
Fábio aprumou-se na cama, antes de engolir em seco. Não entendia o porquê, mas aquela deusa de voz de veludo o queria.
Precisava dizer alguma coisa, mas não sabia nem por onde começar. Não podia se dar ao luxo de falar qualquer besteira, porquanto queria impressionar a voz misteriosa.
Arriscou:
- Também quero você!
- Uau! Um homem decidido! Agora você me desconsertou, meu amor... Quero você agora mesmo! Posso subir até o seu apartamento?
- Como assim? Você está aqui no meu prédio? – perguntou-lhe Fábio, cada vez mais ouriçado com sua possível e inacreditável sorte grande.
- Estou aqui e pronta para o pecado... – miou ela em resposta, com uma voz ainda mais irresistível que alguns minutos atrás.
- Suba!
- Qual é o número do seu ap?
Fábio quase teve um orgasmo solitário ao ouvi-la falar “ap”... Nunca tinha ouvido um ap tão arrastado em sua vida.
- 404. Venha rápido!
- Já estou aqui na porta...- disse ela.
Fábio animou-se. Aquele calor exagerado pedia uma noite de sexo.
Como um guepardo esfomeado, correu o mais rápido possível até a porta de entrada do seu apartamento.
Ainda com o telefone em mãos, olhou pelo olho mágico. Não havia ninguém.
Escutou pelo telefone o som de uma campainha. Um toque desses modernos, bem diferente do seu blin blon.
Estremeceu.
- Eu quero você... – disse-lhe a voz.
Antes que pudesse dizer qualquer coisa, ouviu uma terceira voz - masculina - ao fundo da ligação:
- Também te quero, gata...
Em seguida, caiu a ligação. Não dando tempo de sequer bradar em protesto.
Fábio nunca digeriu muito bem aquela história. Algum sortudo qualquer havia lhe roubado a chance de refestelar-se com a dona daquela inebriante voz... Uma verdadeira tragédia.
Mesmo após muitos anos, atendia os telefonemas com a tola esperança de ouvi-la de novo.
Então, em uma noite qualquer de mais um verão, foi acordado pelo ressoar do telefone. Mesma hora, mesmas circunstâncias.
Suspirou fundo antes de atender o telefone. Sentia que desta vez deveria ser “a voz”.
- Alô.
- Alô... – respondeu a voz.
Fábio sentiu um frisson tomar-lhe o corpo. Até que explodiu em palavras:
- Não acredito que é você... Eu estou lhe esperando há anos. Naquele dia, acho que você se confundiu. Eu disse 404! Venha aqui, sim! Preciso de você! Do seu corpo, da sua voz, da sua alma...
- Senhor Ricardo! – interrompeu a voz. – Eu trabalho na polícia rodoviária federal. Estou ligando para lhe dar uma notícia muito triste. Sua mulher e seus filhos... Bem.. Sinto dizer, mas eles morreram...
Fábio ficou obnubilado. Parecia-lhe que o mundo havia desmoronado sobre sua cabeça. Então, ainda em choque, limitou-se a dizer:
- Não me chamo Ricardo... Meu nome é Fábio.
- Perdoe-me, Senhor – disse a policial. – Acho que foi engano... Devo ter discado algum número errado...
- Tanto faz – respondeu Fábio. - Tanto faz...
2 comentários:
Confesso que quase achei que fosse mesmo acontecer alguma coisa com a dona da "voz" e o Fabio. rsrs
Gostei.
Muito atrativo.
Parabéns Kelvim.
uahauahauah
vou mostrar essa ae pro meu amigo Fábio, isso até tem cara de coisa que aconteceria com ele!
kkkk
adorei a leitura!
=)
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