Foto: tecnologia.uol.com.br
Numa quarta-feira pela manhã, Marina foi tomada de assalto por um frisson, desses que acontecem apenas uma ou, no máximo, duas vezes na vida.
Por algum motivo que ela mesmo desconhecia, resolveu criar um blog.
Com o passar dos meses, sentiu que tinha talento para coisa. Parecia saber exatamente o que escrever e quando escrever.
Em pouco menos de um ano, havia conseguido a façanha de abarcar uma média de 2.000 acessos ao dia.
Todos que acessavam sua página voltavam um dia. Todos.
No entanto, a vida pessoal/social de Marina dirigia-se exatamente no sentido oposto ao sucesso do seu blog.
Primeiro foi seu namorado, Ricardo, quem a abandonou. Alegou ciúmes do notebook, que repousava sobre o colo de sua amada com muito mais frequência do que ele.
Um ano mais tarde, perdeu o emprego após ter sido flagrada por seu chefe atualizando o blog na hora do expediente pela quadragésima terceira vez.
Tudo que Marina precisava resumia-se a um lugar para morar, um notebook, e uma linha telefônica com internet. Nada mais.
Foi a melhor época da sua vida o tempo que viveu sob o manto do seguro-desemprego, porquanto podia ficar mexendo em seu blog o dia inteirinho.
Até que o dinheiro acabou, assim como a luz, o contrato de aluguel e o acesso à internet.
Renegada por sua família e amigos, por conta do vício mal compreendido, Marina viu-se obrigada a vender seus móveis para conseguir sobreviver. Com muito custo, vendeu até mesmo o notebook.
Consequentemente, mesmo morando literalmente debaixo da ponte, usava os trocados que conseguia para comer e para atualizar seu blog em uma lan house, não exatamente nessa mesma ordem.
Marina sentia-se péssima por atualizar sua página apenas uma vez por dia, mas era a única coisa que podia fazer diante dos novos acontecimentos. Mais do que isso, uma questão de sobrevivência.
Alguns dias mais tarde, no entanto, no melhor estilo João de Santo Cristo, viu seu mundo desabar pela segunda vez.
Não estava preparada emocionalmente para ler o último comentário deixado em seu blog.
Em suma, algum anônimo havia comentado que seus textos andavam um pouco desleixados, bem como que suas atualizações não eram mais constantes como outrora.
Marina sentiu o coração acelerado antes de desmaiar sobre o teclado. Quando acordou, estava numa clínica de recuperação para dependentes químicos.
Dias mais tarde, o diretor da clínica - que não fazia a menor ideia do seu verdadeiro vício - incentivou Marina a criar um blog num dos computadores da clínica, a fim de que esta escrevesse sobre seus sentimentos com assiduidade.
E assim Marina agiu.
Estranhamente, foi a paciente que mais tempo permaneceu internada naquela clínica, embora jamais tivesse usado qualquer tipo de droga.
Mas estava feliz. Aliás, feliz como nunca.
Afinal, tudo o que Marina precisava resumia-se a um lugar para morar, um notebook, e uma linha telefônica com internet.
Nada mais.
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