A moça que beijava de olhos abertos: era assim que Camila era conhecida no bairro onde morava, na capital gaúcha.
Foram os rapazes com que havia ficado na juventude que lhe colocaram o apelido. Todos haviam percebido, por óbvio, que ela jamais fechava os olhos enquanto beijava.
Rafael, um dos tantos rapazes que não havia provado do beijo de Camila, sempre dizia aos amigos que se ela não tinha fechado os olhos, era porque não havia gostado do beijo deles.
Sua convicção era tamanha que resolveu apostar com aqueles que lhe arrancaria um beijo irresistível o bastante para que ela fechasse os olhos como nunca.
Seus amigos apostaram alto, já que nenhum deles acreditava que Rafael conseguiria a façanha de fazer Camila fechar seus lindos olhos enquanto o beijava.
Rafael, contudo, confiava no seu poder de sedução. Confiava no seu beijo.
Conquistador nato que era, não estava nem um pouco preocupado. Tanto que conseguiu convencer Camila a irem num barzinho que ficava perto da casa de ambos ainda naquela noite.
De início, ele e Camila estabeleceram uma conversa bastante agradável, com direito a sorrisos para todos os lados e olhares para lá de insinuantes.
Estavam conectados. Mais do que isso, estavam surpreendentemente bem interessados um no outro.
Até que Camila mordeu os próprios lábios como quem espera ser beijada. Havia chegado, enfim, a hora da verdade.
Os amigos de Rafael, que se esgueiravam algumas mesas à esquerda, também perceberam a iminência do beijo. O suficiente para que esticassem seus pescoços em busca do ângulo perfeito.
E o tão aguardado beijo, de fato, aconteceu. Foi suave, carinhoso e sem olhos abertos, para espanto dos amigos de Rafael.
No outro dia, Rafael confidenciou aos amigos:
- Vou me casar!
Inicialmente, todos achavam que ele estava brincando. Não conseguiam conceber a ideia de que Rafael - o conquistador, como era conhecido no bairro -, iria assumir um compromisso tão sério quanto o casamento.
Até que Júlio, o mais desconfiado dos amigos, perguntou-lhe:
- Mas por que você vai se casar assim tão rápido? O que a ela tem de tão especial, afinal?
A pergunta antecedeu um silêncio sem precedentes. Júlio havia feito o questionamento que nenhum dos outros amigos se atreveria a fazer.
Rafael, porém, sorriu. Em seguida, disse-lhes:
- Se vocês soubessem o quão é bom o beijo de Camila quando seus olhos estão fechados... Se vocês soubessem...
Seus amigos suspiraram quase que em sincronia. Afinal, se o beijo de Camila com os olhos abertos já era algo transcendental, imagine o com os olhos fechados.
Naquele momento, todos invejaram Rafael. Que sorte tinha aquele homem... Que sorte.